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Mostrando postagens de setembro, 2015

Recordações

Com olhos cheios de saudade ela sentou na cadeira de balanço dos seus sonhos para relembrar através de algumas fotos a trajetória de quem tanto lutou. As marcas em sua alma não a deixam esquecer nem um só segundo que ela também não fugiu do combate. E não se arrependeu. Como eles também não teriam se arrependido se aqui estivessem. Na imagem do abraço terno de Iarinha ela relembra Maria Regina. Filha também de outro herói, Raimundo. Em suas fotos de criança ela relembra Janu e Marcos, seus iguais. Iguais em tudo, até na capacidade de se dar e de amar. Ela fecha os olhos. Imagens do maior ato de amor que já tivera conhecimento em toda sua vida surgem na sua imaginação. Os criminosos invadindo a casa de Quintino após assassinarem Lígia grávida impiedosamente. Marcos, Maria Regina e James tentando fugir pulando um muro nos fundos. James consegue pular e se esconde. Marcos consegue subir no muro. Precisavam ser rápidos. Os criminosos já estavam lá. Marcos estende a mão para Ma

Se existem Damas elas são do Samba

Era noite. Chovia e Ventava. Mesmo assim chegaram para pré-estreia radiantes como sempre. Cada uma com sua beleza, sua força, sua energia e sua luz.  Entraram cinema adentro docemente silenciosas sem que ninguém percebesse. Sentaram-se bem perto de Dona Ivone Lara só para admira-la um pouquinho mais. Em seus shows estão sempre presentes. Não deixam de ir por nada. Aguardaram ansiosas pelo início do filme. Curioso ninguém ter percebido tão ilustres presenças femininas. Desconfio que algumas pessoas até sentiram a energia só não se deram conta da sua origem. Começava a sessão. Encantadas foram se deliciando imagem após imagem. Cantaram bem baixinho. Dançaram timidamente sem sair da cadeira. Choraram de emoção. Aplaudiram com todas as suas forças numa felicidade só. É tanto olhar, tanta força, tanta luz, tanta doçura que elas chegaram a se enxergar na tela. Quanta homenagem. Puro merecimento. O filme terminava. Era hora de ir embora. As luzes começaram a se acender enquanto elas

Numa Escola que só poderia ser em Havana

Outro dia assisti a um filme sem muito esperar. Confesso que minha emoção foi pega de surpresa. A linda história de dois Cubanos acariciou delicadamente no escuro do cinema os meus olhos com doces lágrimas. Em uma Cuba repleta de dificuldades provocadas pelo maldito bloqueio imperialista o coração apaixonado de um Povo nos salta os olhos através das generosas figuras do menino Chala e da professora Carmela. Duas gerações de doces Revolucionários. Cada um a seu jeito lutando pelo que acreditam sem abrir mão do amor nem por um segundo sequer. Como é Soberana a capacidade de vencer as dificuldades de um Povo que não se entrega, de um Povo que se afirma como tal, que não se nega, que se recusa a fechar os olhos diante de sua própria imagem mesmo quando se vê refletido praticamente despido perante esse nosso mundo falsamente globalizado que teima em desconhecê-lo profundamente. É preciso ter muita coragem para realizar um filme como esse, um filme que retrata questões que precisam

A (Des)Humanidade seletiva. Ou sobre a trágica morte de dois meninos

Escrever dois textos seguidos sobre a morte trágica de crianças nunca foi nem nunca será algo capaz de me realizar como escritora ou poeta. Triste daqueles que aprenderam facilmente a técnica de sobrevoar friamente a dor através das palavras. Eu nunca aprendi. Me recuso. Não ouso banalizar o que me machuca a alma. Por isso verso, se bem que de vez em quando alguns poemas meus teimam em se travestir de prosa. Hoje decidi escrever sobre algo que nos faz sangrar de dor, sobre algo que nos despe em carne viva devorando de indignação e agonia nosso mais profundo desejo de viver em um mundo melhor. Por um único e simples motivo. Não posso me dar ao direito de fugir da escrita no exato momento em que é necessário estender a voz aos que já não a tem mais. Certo dia, em um mar distante o menino Aylan, vítima da guerra, do ódio, da intolerância e do preconceito foi assassinado pela indiferença que nos une e nos separa como seres humanos. Não faz muito tempo, aqui bem perto, em nosso próprio s

O Pequeno (Refugiado)

Ele acordou assustado como fazia todas as manhãs. Correu para abraçar sua mãe. Ele não era filho único. Compartilhava seus medos com os irmãos mais velhos. Sua mãe amorosamente corajosa acolhia a todos. Tudo que ela sabia era que o tempo de sua família se esgotava rapidamente. O pai cheio de cicatrizes na alma apenas observava. Seu silêncio ardia em brasa diante da indignação de não poder mais lutar contra o sofrimento diário de sua mulher e filhos.  Nada a eles restava que não fosse a esperança da fuga, a busca quase que desesperada por um outro futuro. Ousaram sonhar.  Pensaram que poderiam viver em paz. Se não aqui, talvez em um outro lugar. Bem distante. Imaginaram. Além mar não contavam com a intolerância que os aguardava de braços abertos. Sonhavam com a acolhida, com o estender das mãos. Ainda acreditavam infantilmente na humanidade. Chegaram a uma conclusão. Que para encontrar com o sonho, para vê-lo de perto, de carne e osso, era preciso partir urgentemente.  Na